NFP chama Domingos Vaz Sodré
Capitão-mór de Santa Cruz
N. no decénio de 1470 e veio para os Açores com os pais.
Os desentendimentos entre seu pai e o capitão Pedro Correia, acima referidos, levaram a que este se tivesse oposto vivamente ao casamento de sua filha D. Briolanja com Diogo Vazo
Procurando nas entrelinhas das crónicas o que na verdade se teria passado, vamos dar novamente a palavra a Frutuoso (Gaspar Frutuoso, Livro Sexto das Saudades da Terra, p. 311 e 312), tentando uma reconstituição dos acontecimentos: «Dona Branca, ou como outros dizem, Dona Briolanja, filha do capitão Pero Correia, depois de estar em etrra por espaço de dois ou três anos, se casou a furto com Diogo Vaz Sodré, filho de Vasco Gil Sodré, sem o capitão ser sabedor deste casamento, determinando de a casar com um fidalgo de Portugal».
A primeira informação que o cronista nos dá é de que Diogo Vaz casou «a furto», isto é, clandestinamente. Mas pala análise posterior do texto, cremos ser mais correcto pensar-se que ambos se tinham apalavrado ou comprometido a celebrar casamento e o que nesta altura existia era um namoro contrariado pelo pai de D. Briolanja. É isto que faz sentido, pois ao determinar casar a filha com outro, diz-nos o cronista que «mandou Dona Branca aviso a Diogo Vaz, o qual se foi logo dentro a casa do capitão e, achando-o assentado pera jantar, lhe disse que era casado com ela e, como desejava que tudo se fizesse pacificamente, a não quisera mandar pedir por outrem e por isso ia em pessoa, que folgaria que sua mercê fosse disso contente, pois já estava feito».
Também aqui as coisas nos parecem fáceis de explicar. Diogo Vaz, em pessoa, informa Pedro Correia de que estava comprometido ou namorado com a filha e pede-lhe aprovação e consentimento, respondendo-lhe «o capitão que, se ele quisesse a sua negra Briolanja, de boa vontade lha daria, se ela o quisesse».
Esta resposta soberba exaltou os ânimos. Apesar de tudo, Diogo Vaz conseguiu conter-se e retorquiu «que tomava aquelas palavras dele como de pai, porque se isso não, logo ali acabaram a demanda». Pedro Correia não se demoveu e «passando outras palavras (leiam-se insultos) com que Diogo Vaz, cheio de cólera, queria arrancar da espada, olhou pera Dona Branca, que em um estrado estava assentada, e, vendo que as lágrimas lhe corriam pelo rosto abaixo, com a dor dela se deteve e se desceu pela escada pera fora».
Se, num mero, mas aceitável, exercício cronológico aceitarmos que no momento desta cena D. Briolanja contasse os seus 20 a 25 anos de idade, situaremos o seu nascimento (no Porto Santo?) por volta de 1475, talvez um pouco antes, ocasião em que a Pedro Correia, na sequência da nova política da Casa de Aveiro para o povoamento das ilhas e talvez em compensação da perda da capitania do Porto Santo (1473), foi atribuída a capitania da Graciosa.
O panorama era este e o tempo foi decorrendo até que Pedro Correia acabou por morrer em Lisboa em 1499. E, pelo que veremos adiante, não é crível que numa ilha tão pequena e tão pouco povoada, pudesse haver um casamento clandestino sem que fosse sabido.
Os ódios iam aumentando face ao porfiado namoro do Sodré com Briolanja Correia. De tal maneira que, «por se suspeitar que ele ia de noite e falava com ela, seu irmão Duarte Correia, com muitos homens da casa do capitão, o andavam espiando pera o matarem, o que sabendo Diogo Vaz, também andava acompanhado com seu irmão Fernão Vaz Sodré e alguns criados, até que se vieram a encontrar uns com outros e, tendo grande briga, em que se feriram muitos de parte a parte, foi de modo que houve muitas querelas; e tudo sobre dizer o capitão que Diogo Vaz não era tão fidalgo como ele».
Foi por esta razão que, feridos nos seus brios, «determinaram, então os dois irmãos Diogo Vaz e Fernão Vaz de irem buscar ao reino o brasão de seu pai». E como, por documentação fiável, sabemos que Diogo Vaz Sodré obteve despacho favorável das suas diligências, com a concessão de uma carta de brasão datada de 23.3.1503 (No finais do séc. XIX, um seu descendente, Manuel Veloso Armelim - vid. ARMELIM, § 1°, n° 7 -, apresentou um conjunto de documentos na Mordomia da Casa Real, entre os quais uma certidão tabeliónica desta carta, a qual, depois de encerrado o processo lhe foi devolvida a seu pedido, pelo que perdemos uma bela oportunidade de conhecer o seu conteúdo), teremos que situar o episódio acima descrito por Frutuoso como tendo acontecido em 1502 ou, o mais tardar, no início de 1503.
Infere-se da continuação destas peripécias que Fernão Vaz Sodré não chegou a ir ao Reino, mudando-se, como já se disse, para a ilha de S. Miguel. Assim como, foi também por esta altura que D. Briolanja «se sentiu pejada, (e) mandou dizer a seu marido (Entenda-se, comprometido, noivo, namorado ... Se assim não fosse, como entender que Frutuoso diga mais adiante que eles casaram, depois de ele chegar de Lisboa com a sua carta de armas?) que a tirasse uma noite de casa e a levasse consigo, ou a deixasse em alguma outra; e por que ela não fizesse algum desatino, lhe mandou dizer Diogo Vaz que ele não se queria ir, mas mandava seu irmão. Como teve tempo e o barco prestes para partir, a justiça se pôs, muito acompanhada de gente, no porto da Barra pera os prenderem, por causa das querelas que deles tinham dado. Diogo Vaz, como era muito valente homem, cavalgando em um cavalo, armado com uma lança nas mãos, se foi ao porto, onde pelejou esforçadamente com toda a justiça e mais contrários, e, recuando com o cavalo até chegar à borda do mar, com um negro que consigo levava, chegando ali, à barca" saltou de cima do cavalo nela e se foi pera a caravela, que andava à vela, esperando por ele (00') e tornando-se pera a ilha Graciosa com o brasão que apresentou, lhe perdoou o capitão, e casou com a dita dona Branca, ou Briolanja e, casados, viveram muitos anos e houveram muitos filhos, e deles procede grande geração de gente nobre».